sábado, 3 de maio de 2008

A idade da inocência, Edith Wharton

" Uma coisa ele sabia que tinha perdido: a flor da vida. Mas pensava nela como uma coisa tão inantingível e improvável que lamentar-se seria como desesperar porque não se ganhou o primeiro prémio da lotaria. Havia cem milhões de bilhetes na sua lotaria e só um prémio. As chances foram todas definitivamente contra ele."
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"A sua afirmação - as mulheres deviam ser livres, livres como nós - ia até ao fundo de um problema que no seu mundo se convencionara não existir. "Boas" mulheres, embora injustiçadas, nunca exigiriam o género de liberdade que ele pensava, e homens de espírito generoso como ele ficavam - assim no calor do argumento - cavalheirescamente prontos para conceder-lha."
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" Desde então não houvera mais comunicação entre eles e ele tinha construído dentro de si uma espécie de santuário em que ela estava entronizada entre os seus pensamentos secretos e a saudade. Pouco a pouco tornou se o cenário da vida real, das suas actividades racionais; daí trazia os livros que lia, as ideias, e os sentimentos que o atormentavam, os julgamentos e visões. Fora dele, no cenário da sua vida presente, movia-se com um sentido presente de irrealidade e insuficiência, debatendo- se contra preconceitos familiares e pontos de vista tradicionais como um homem distraído vai de encontro à mobília do quarto. Ele estava tão ausente de tudo o que era real e tão próximo dos que estavam à sua volta que às vezes sobressaltava-o descobrir que eles ainda o imaginavam ali."
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"- Não me esperava hoje?
- Oh, não.
- Eu pensava ir a Washington vê-la. Já tinha tudo planeado. Quase me cruzei consigo no comboio.
- Oh - exclamou ela como que aterrada pelo quase desencontro.
- Sabe, quase não me lembrava de si.
- Quase não se lembrava de mim?
- Isto é, como hei-de explicar? É sempre assim: de cada vez, você acontece-me outra vez.
- Oh, sim, eu sei, eu sei.
- Acontece, eu também para si? - insistiu.
Ela acenou, olhando para fora da janela.
- Ellen, Ellen, Ellen.
Ela não respondeu e ele sentou-se em silêncio vendo o perfil dela tornar-se indistinto contra o lusco-fusco entardecido de neve, para lá da janela. Que tinha ele feito em todos aqueles quatro meses - pensou -, como afinal sabiam pouco um do outro! Os momentos preciosos estavam a passar, mas ele esquecera-se de tudo o que pensara dizer-lhe e só podia pensar, desamparado, no mistério do seu afastamento e da sua proximidade, que parecia ser simbolizado pelo facto de eles se sentarem tão junto um do outro e de, no entanto, não conseguirem ver o rosto um do outro."

1 comentário:

Post-It disse...

Tudo na vida é uma questão de timming, está visto...