Cena II
O honrado chefe de família e a esposa extremosa
A esposa extremosa: - Serapião!Não tenho dinheiro senão para mais três dias...
O honrado chefe de família: - O quê? Que me dizes, Belisária?
A esposa extremosa: - Tenho feito toda a espécie de economias. Dos nossos seis filhos, três comem um dia sim, os outros três esse dia não e assim sucessivamente. Vou todos os dias aqui da nossa casa em Santa Marta - a tal que há-de morrer farta - a uma tenda no Caminho de Ferro, só porque lá vendem a banha de porco dois tostões mais barata em cada arroba. Regateio, choro, arranco o cabelo! (Mostra a cabeça completamente careca) Pois, apesar disso, hoje de manhã verifiquei que não me chega o dinheiro senão para três dias.
O honrado chefe de família: - Três dias?Quantos são hoje?
O calendário: - Vinte e cinco.
O honrado chefe de família: - É horrível! Com licença, ó Belisária! (Arranca com desespero seis cabelos que a esposa extremosa ainda tinha no alto da cabeça).
O botão de madrepérola: - Olha que esses cabelos não são teus...
O honrado chefe de família:(Baixo) - Bem sei. Por isso mesmo é que os arranco tão febrilmente...
O botão de osso do colarinho: (Ao de madrepérola) -Não te metas em questões de família. ( o botão do peitilho sai pelas ceroulas abaixo).
O honrado chefe de família: - Que situação! Que havemos de fazer? O tendeiro já não fia?
A extremosa esposa: - Isso sim. Vendeu a roca para comprar acções duma fábrica de tecidos a vapor.
O honrado chefe de família: - Tens ainda algum colar de pérolas para pôr no prego?
A extremosa esposa: (Procurando nos bolsos do avental) - Não tenho, não. Dei o último por uma dúzia de carapaus.
O honrado chefe de família: - Com licença, ó Belisária! (Quer arrancar-lhe mais alguns cabelos, mas nota com desgosto que os seis cabelos de há pouco eram os últimos que a pobre senhora tinha).
A extremosa esposa: - Olha, Serapião! Se queres dar mostras da mais viva agitação, arranca-me estes pêlos do buço. (Mostra o bigode à americana).
O honrado chefe de família: - Não. Já agora arranco o meus cabelinhos do nariz. Não me servem para nada. (E fá-lo).
Cai o pano
***
1 comentário:
:D
Por esta altura já estava carequinha, também!
(E o dia do trabalhador, cof cof desempregado, aproxima-se vertiginosamenteee!)
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